sexta-feira, 5 de julho de 2013

A Nova Tarifa


Após a confirmação da isenção do ISSQN, a prefeitura definiu a nova passagem dos ônibus e liberou a planilha de cálculo atualizada. A prefeitura fez um grande alarde que estaria liberando a tal planilha da transparência. Isto, entretanto, foi um factóide: a planilha que eles disponibilizaram já vinha sendo entregue. O que se reclama é que ela é confusão, não entrega todos os dados e só é apresentada após a tarifa ser aprovada, o que impede que fontes independentes (como este blog) validem seus dados.

Para quem não está familiarizado com os termos usados aqui, sugiro ler o meu texto que explica os conceitos básicos. Quem tiver maior interesse no assunto, veja a compilação de artigos explicando com o sistema funciona e propostas de melhoria.

Análise Inicial


Pois bem, avaliei esta nova planilha hoje. Embora a planilha referente à tarifa de R$ 3,05 não tenha sido entregue, esta não parece ser a mesma base de cálculo, excluindo-se os impostos liberados. Esta era uma suspeita que eu tinha, mas não parece ter se confirmado. Entretanto, ela reajusta os principais indicadores de preço, logo, os consórcios devem estar satisfeitos.

A planilha, infelizmente, está mais confusa do que nunca. Vejamos alguns problemas técnicos que eu identifiquei:
  • Como de costume, não há informação de passageiros equivalentes por categoria;
  • Desta vez trocaram o PMM (percurso médio mensal por ônibus) pelo valor total percorrido pela frota. A conversão tem que ser feita a mão, pois o que se usa é o PMM;
  • O cálculo da depreciação e remuneração não bate, usando a mesma regra usada na planilha do ano passado (e a que faz sentido!);
  • Alteraram a apresentação de vários dados do "valor por ônibus" diretamente para o "custo por quilômetro".
Pois bem, quais elementos mudaram da tarifa de R$ 2,85 para esta nova tarifa de R$ 2,80?
  1. Desoneração dos tributos, o que reduz a tarifa em 20 centavos;
  2. Desoneração da folha de pagamento, conforme o TCE já havia solicitado. Esta medida reduziu a tarifa em 11 centavos;
  3. Aumento da ordem de 1% nos insumos lubrificante, combustível e pneus;
  4. Dissídio dos funcionários;
  5. Aumento e envelhecimento da frota;
  6. Aumento altíssimo do custo dos ônibus;
  7. Aumento do número de funcionários maior que o aumento da frota;
  8. Aumento da rodagem, aumentando a tarifa em 8 centavos;
  9. Atualização do IPK, responsável por um aumento de 12 centavos.
Analisando os dados, é fácil ver que a estrutura do nosso sistema segue piorando. Cada dia pagamos mais pelo nosso transporte. Não se enganem com esta pequena queda de preços! O IPK despencou novamente, mostrando que menos pessoas tem usado (ou pagado) pelo sistema.

No que devemos prestar especial atenção?

Funcionários


Primeiramente, é importante registrar que o dissídio dos funcionários já está contabilizado. Logo, atente para qualquer reclamação das empresas neste ponto.

O mais estranho, entretanto, é que o crescimento no número de funcionários. O número cresceu mais que a frota de ônibus! Isto pode ser visto pelo aumento do indicador FU.

A pergunta que fica é: o número de funcionários realmente aumentou? Por que?

Frota e Rodagem


Enquanto o número de usuários segue caindo, o número de veículos da frota e o total de quilômetros rodados segue crescendo! A variação do último ano é assustadora:
  • Tamanho da Frota: Aumento de 35 carros, ou 2%;
  • Custo do Ônibus: Aumento de 20% do carro médio e 12% do híbrido leve;
  • Rodagem: Aumento de 12%!!!
Este aumento da frota chama atenção, dado que não há aumento do número de usuários. O aumento do custo do carro, entretanto, é escandaloso! É importante que haja uma auditoria já neste item! Note que a frota envelheceu, mas ficou mais cara. A depreciação faria um efeito de barateamento da frota média entre 15% e 6%. Logo, o preço médio dos veículos novos precisam subir ainda mais para contrabalancear este efeito.

No que tange a frota reserva, houve um claro ajuste. A lei permite até 10% de veículos para esta frota, número que estava acima deste limite nos anos anteriores. Este ano, o percentual são exatos 10%!

O aumento da rodagem também é escandaloso. Já vinhamos tendo, ano a ano, um aumento, mas desta vez foi demais! O que se deve perguntar aqui é:

  • Quantas linhas novas foram acrescentadas no sistema?
  • Quantas linhas tiveram seu trajeto aumentado?
  • Quantas novas viagens foram criadas?
Honestamente, não consigo conceber este aumento de rodagem. Minha percepção pessoal - embora puramente anedótica - é que os ônibus estão menos frequentes. Estamos falando aqui, entretanto, - e salvo a criação de diversas novas linhas - de um aumento de 10% na frequência de todas as linhas operando na cidade. Isto definitivamente seria fácil de se observar!

A rodagem elevada é hoje um dos principais problemas que nosso sistema possui. Precisamos urgentemente reformular nossa estrutura de linhas, fundindo ou excluindo linhas. Para se ter uma ideia da capacidade ociosa do sistema, basta pensar que um ônibus comporta cerca de 80 passageiros. Temos 1540 ônibus na frota operacional. Assim, temos capacidade de transportar, a cada instante, 123 mil passageiros.

Considerando que são transportados cerca de 1 milhão de passageiros por dia, podemos observar que os ônibus trabalham muito abaixo de sua capacidade. Provavelmente menos de 1/4 da capacidade. 

IPK


Aqui, mais uma má notícia. O IPK caiu 5%, o que mostra uma perda de eficiência enorme no sistema.

Entretanto, é importante observar que tivemos um aumento descomunal na rodagem. Como a planilha não fornece dados de passageiros transportados, é possível que tenha ocorrido um aumento que tenha sido ofuscado pelo aumento da rodagem.

Sem estes dados, é difícil saber exatamente o que aconteceu. A planilha precisa apresentar este tipo de informação urgentemente! Entretanto, seja qual for a causa, a notícia é ruim!

Diversos


Já havia mencionado este problema anteriormente: o cálculo do custo de pessoal administrativo está errado! Incrível que ninguém fala disso! A lei 14.459/04 é clara ao informar que este custo é 11,78% do custo do pessoal operacional! A planilha segue aplicando este percentual sobre o pessoal operacional mais manutenção. A diferença, este ano, causa um aumento dos custos de 2 centavos.

Por fim, este ano a tarifa calculada foi menor que a tarifa decretada em 1 centavo. Embora faça parte do jogo, estamos dando uma gorjeta para as empresas de ônibus. De fato, faz mais sentido arredondar R$2,79 para R$ 2,80. Contudo, se o erro do pessoal operacional não corresse, o custo calculado seria de R$ 2,77. Aí faria mais sentido arredondar para R$ 2,75. Assim, na minha opinião, a tarifa está 5 centavos mais cara do que deveria!

13 comentários:

  1. Pois é, pra mim essa transparência tá muito opaca. Criam uma planilha pra dar um ar de legalidade pra coisa, mas tem um bocado de números que você pode simplesmente inventar pra chegar onde você quer.

    Caso em tela esse súbito incremento na rodagem. Não temos, como cidadãos, como aferir que a frota rodou a quilometragem declarada. Há maneiras de resolver isso, e o jeito é ter mais transparência das informações já existentes. Os ônibus hoje têm GPS e transmitem sua posição continuamente à EPTC para controlar a assiduidade do serviço[1], mas a EPTC mantém os dados produzidos por isso guardados à sete chaves. Essa informação deveria ser pública. Se alguém nesse governo tivesse culhões, já o teria feito.

    [1] (embora eu tenha minhas dúvidas que a EPTC realmente exerça essa fiscalização)

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  2. Não há GPS em todos os ônibus. Eles tem, contudo, transponders que são suados para bipar seu prefixo para um conjunto de 50 e tantas antenas pela cidade. O nome deste sistema é SOMA e é usado para fiscalizar por cima se as viagens foram de fato realizadas. Ele não é 100%, mas,em teoria, pega estas coisas.

    Um sistema com GPS seria muito melhor. Talvez com o BRT acabemos evoluindo toda a frota para isso.

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  3. Interessante, achava que já era GPS em tudo. Não me parece proibitivamente caro. Mas enfim, se divulgassem os dados produzidos pelo SOMA, eu já estaria imensamente feliz. Mas nem isso né.

    E quanto ao BRT: pelo que eu tô entendendo, querem prender toda e qualquer ideia de licitação nova ao lançamento do BRT. Só que, pelo que eu já li, o BRT só vai ficar pronto em 2017.

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  4. Na época em que foi implantado o sistema de controle o GPS era caro e não tinha a resolução que tem nos dias de hoje (o governo americano introduzia um ruído para evitar o uso militar por outros países!), mas nos dias de hoje o sistema de monitoramento adotado é ineficiente e caro, realmente a migração para o GPS seria mais barato a longo prazo, dando mais informações como velocidade média, máximas e mínimas, identificando por exemplo dois ônibus da mesma linha passando um atrás do outro e depois o pessoal ficando horas esperando o próximo.

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  5. Se não me engano as lotações que tem gps.

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  6. Outra coisa que senti falta foi o abatimento dos ganhos recebidos com a publicidade feita atrás dos ônibus nessa planilha. Acredito que em mais de 1500 ônibus, essa seja uma quantia significativa.

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    1. Cristiano,
      A lei 364 de 1995 prevê que as verbas de publicidade dos ônibus devem ser direcionadas ao plano de saúde dos funcionários. De minha parte, acho que esta lei tem que cair e todos as receitas e custos irem para o mesmo bolo, mas hoje ela é a lei.

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    2. Alex,
      Obrigado pelo esclarecimento (que a prefeitura, com seu canal no facebook, e a eptc no fale conosco não foram capazes de fornecer).
      Porém, olhando a planilha, há uma aba exclusiva para "custo por quilômetro plano de saúde", e isso entra no valor da tarifa. Além do mais, seria muito mais justo, como tu disseste, colocar tudo no mesmo bolo. Afinal, quem garante que o valor dos planos de saúde é superior a esses ganhos?

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    3. Cristiano,
      Me disseram que o plano de saúde que consta na planilha seria ambulatorial e o que é pago com a publicidade seria o hospitalar. Achei bizarro, pois normalmente tu tens ou um ou outro. Este "me disseram" foi o melhor que consegui sobre esta informação.

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  7. Prezado Alex e demais interlocutorxs. Acredito que vocês já tenham estes dados, mas, de toda forma, envio aqui dois links com os dados de passageiros transportados y otras cositas más, que fica no site da EPTC. De fato, eles deveriam colocar esta informação na própria planilha, dada a relevância dos números (oxalá seja o gestor público o aferidor da informação e não o prestador do serviço seu informante):
    1) Total de passageiros por ano e tipo: http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/eptc/usu_doc/total_passageiros_trans_tipo_jun2013.pdf
    2) Vejam "Indicadores operacionais": http://www2.portoalegre.rs.gov.br/eptc/default.php?p_secao=155

    A propósito: vocês viram o curioso fato de que 80% da frota não alcança o valor médio ponderado por veículo (R$471.000) que é usado pra depreciação? Por sinal, tenho uma ligeira sensação de que os melhores ônibus, na rua, são da Carris (na tabela, tem ônibus que custa quase R$900.000), o que deixaria os seus carros em ampla defasagem nos valores de depreciação (por um lado) e, ao mesmo tempo (por outro lado), elevando a média de valor para a maioria da frota. Se for este o caso, além de seguros outros fatores, não estranho muito o déficit da empresa, mas admiro sua "solidariedade" para com as demais.

    Ainda, pela tabela de cálculo, tão veementemente difundida pela administração municipal, fiquei deveras curioso em saber por que no valor por quilômetro referente a "pessoal" são contabilizados (pela estrutura do cálculo) 1.500 fiscais. Tudo bem, em existindo 1.500 ônibus, supor que haja 1.500 motoristas e 1.500 cobradores, mas 1.500 fiscais?

    Bem, não quero me estender nesta módica discussão.

    Grande abraço e parabéns pelo auspicioso debate.

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  8. Ah, perdão. Esqueci de comentar que eu considero desproporcional o montante acima de 8 milhões de reais que são pagos anualmente por quem paga passagem (pelo que me parece, a um valor aproximado de R$0,04 por passagem) a título de pró-labore às 13 direções das empresas. Se já não estiver incluído na ferramenta, poderia ser algo a mais pra se discutir como fator de redução.
    Saudações.

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  9. Beto,
    Obrigado pelos links! Ainda não tinha os dados de 2012 de demanda. Suponho que tenham publicado recentemente, pois supunha que a publicação era em julho. Vou usá-los para atualizar minha planilha de simulação!

    Sobre o valor dos ônibus, é esperado este fenômeno. Os ônibus com ar-condicionado puxam ligeiramente para cima o preço dos ônibus sem ar-condicionado, mas o valor é propelido pelo valor dos ônibus articulados. Mesmo tendo uma quantidade pequena, o valor médio é quase o dobro. Já pelo lado dos baratos, eles têm maior quantidade, mas o preço não é muito menor.

    Sobre os fiscais, não entendi a tua conta. A planilha fala de um FU de 0,35, ou seja, 0,35 fiscais por ônibus. Ou seja, estamos falando de algo da ordem de 600 fiscais. Este teu número veio de onde?

    Sobre o pró-labore, é o que é definido por lei. O valor é estabelecido como 5 vezes o salário do motorista e são permitidos até 3 diretores pro empresa. O salário em si não me incomoda tanto, ate porque deve ser maior na prática. O que me incomoda é a correlação com o valor pago ao motorista e o fato que o número de diretores é um limite por empresa e não para o sistema inteiro. Isto gera dois efeitos negativos: quanto mais um motorista ganha, tanto mais aumenta este valor e quanto mais empresas temos no sistema, mais caro ele fica (o que deveria ser o contrário).

    Abraços e obrigado pelas considerações!

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    1. De fato. Foi um equívoco de leitura (desconsiderei o FU), mas ainda estou intrigado.
      Quanto a algumas dúvidas que comentaste sobre "fazer as contas fechar", por exemplo, sobre REMUNERAÇÃO, eu intuo que foi utilizada a frota de carros que totaliza 1540 veículos e não aquela ali da planilha (1694) pois, veja:
      1) Tomando cada valor da Frota (0-1 = 137; 1-2 = 233;...; >10 = 16), multiplicando por 1540 e dividindo por 1694 (pra ter uma aproximação, afinal, eles não disponibilizam a frota, por ano, pra que feche os 1540) e
      2) Os resultados de cada linha, multiplicados por aqueles Coeficientes que ali constam e
      3) Somando-se estes resultados finais, dá um Total Mensal de 8,3767 (com erro no centésimo, comparado ao valor de 8,3006 o que seria provável e possível, devido à aproximação citada acima).
      De toda forma, concordo: os números, assim como estão ali, não fecham.
      Vamos em frente. Parabéns pela obra!
      Abraço.

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